sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Catecismo da Educação – Abade René Bethléem – 1917 - Parte 4

Livro III – A educação Intelectual

“A alimentação da inteligência é como a alimentação do corpo. Não é o que se come que nutre, mas unicamente o que se digere.”

Já li algumas coisas, anteriormente, que falam sobre a importância da educação intelectual no processo de formação da criança. No entanto, esta parte do Catecismo da Educação somou, e muito, em conhecimento para mim como mãe.  Quando se pensa em intelecto é preciso se atentar a várias condições necessárias para que seja conquistada uma educação intelectual robusta. Qual não foi minha surpresa quando a primeira condição a ser abordada foi a condição física. Sim, a condição física, o meio em que a criança esta inserida, pesa muito para a formação de seu intelecto. A ação que o meio exerce pode ser por vezes, invisível ou não perceptível, porém é forte. A criança é sensível a tudo o que ocorre ao seu redor e acaba sendo influenciada, mesmo que inconscientemente por tudo que a cerca.

“Caso nada se possa fazer para elevar o meio em que se vive, esforça-se ao menos para evitar a todo custo a deformação.”
“Pelo menos que a criança nada veja e nada ouça de insensato. Por ser intelectualmente falso; nada de grosseiro ou inconveniente por ser moralmente falso: o espírito vive da verdade, e o erro deforma-o. 

A partir de um meio sadio, onde se convive e se valoriza o Belo e a Verdade, os pais podem então iniciar a formação do intelecto dos filhos cultivando a cultura de atenção, indicada pelo autor como o segredo da preparação intelectual.  É preciso que a criança tenha interesse pelas coisas que a cercam. A natureza, o convívio entre as pessoas, a dinâmica da sociedade em que esta inserida e caso este interesse não exista, deve então ser despertado pelos pais, através de estímulos.

É preciso treinar a visão, através de passeios e da observação da natureza. Enxergar o reflexo da perfeição do Criador em suas obras, no desabrochar de uma flor, nos ciclos vividos pelas árvores, na procriação dos animais, na dinâmica das estações, por fim, em toda a sua criação.

É Preciso treinar os ouvidos/ audição com a contação de histórias. Que sejam curtas, verdadeiras, interessantes, cristãs. Que tudo o que chegar aos ouvidos da criança leve a verdade, o belo e que não a canse em demasiado. Que a criança consiga absorver a mensagem da história. Digeri-la como se digere o alimento, retirando tudo o que seja proveitoso para sua formação e assim aprender com ela.

Para que as informações recebidas através dos estímulos (leitura, estudos, observação do meio, etc.) sejam transformadas em conhecimento e que este conhecimento seja assimilado, são necessárias condições como: o exercício da atenção e o hábito da reflexão. De pouco ou nada valerá horas e horas de empenho por parte dos pais, seja na preparação de atividades e programas curriculares, se a criança não tem interesse por aquilo que esta sendo dito.

Na atualidade, perdeu-se a visão da finalidade da educação de uma pessoa, que deveria ser a conquista do conhecimento e da sabedoria. Em se tratando de cristãos, perdeu-se ainda mais. Como cristãos temos o dever de buscarmos esse conhecimento e esta sabedoria, para que estes sejam pontes que nos levem à Santidade, à contemplação de Deus.  Hoje, infelizmente, os pais ao tratarem da educação intelectual dos filhos, preocupam-se apenas com os índices de aprovações dos colégios e em como este auxiliará na conquista de uma carreira promissora e rentável para seus filhos. A finalidade da educação deixou de ser a busca pela santidade através do conhecimento e passou a ser a busca pelo status e pelo prazer corporal.

Nesta busca por índices e posições, os pais e as escolas sobrecarregam as crianças. Aos 5 anos, elas tem uma agenda cheia. É preciso saber nadar, pintar, falar três línguas e estar alfabetizada em pelo menos uma delas, estar em constante socialização e em contato com conflitos (muito comuns nas escolas e creches) mesmo que não saibam discernir o que querem comer ou saber como e quando ir ao banheiro. Não sobra tempo para ser criança. Cada vez mais cedo são deixadas nas escolas, geralmente em período integral. É preciso estar à frente, saber mais, ser mais. Uma triste realidade.

O catecismo da educação deu um nome a este quadro: A sumernage – pode ser definida como uma forma de educação intelectual na qual a criança trabalha cedo demais, trabalha coisas demais e trabalha mal. As causas do sumernage são: o espírito de utilitarismo (é preciso aprender, não para saber, mas para tirar proveito) e furor por boas posições (bom trabalho, boa renda, etc).”

“A concorrência é enorme e por uma consequência necessária e imediata, multiplicam-se os exames, sobrecarregam-se os programas ano a ano.”

Nas palavras do autor - “Conheço muitos pais que são realmente os inimigos de seus filhos. Com a ambição de os ver progredir  rapidamente e obter em tudo uma superioridade extraordinária, sobrecarregam-nos com um trabalho tão pesado que os acabrunham.”

Esta frase me fez refletir por dias a fio, tendo em vista que estamos em Janeiro e eu, como mãe educadora, estava planejando nosso ano de estudos, envolta na preparação de atividades e apostilas, pesquisas de livros literários e buscando enriquecer nosso curriculum para 2018 com aquelas coisas ‘essenciais’ para a idade dele. Tive que reavaliar, tirar muitas coisas, trocar outras. Voltar os meus pensamentos e os meus olhos para a principal finalidade da educação intelectual de nossos filhos. Me perguntar novamente o ‘para que’ educar nossos filhos em casa. Olhar novamente para eles, enxergá-los como crianças que são, priorizar seus momentos de lazer e brincadeiras, tornar-me novamente sua aliada nessa caminhada pelo conhecimento.

Pode parecer loucura o que vou escrever agora, mas se pararmos para olhar como estamos lidando com nossas crianças e conduzindo sua primeira infância, estamos sujeitando-as constantemente a uma violência intelectual, ou seja, estamos sujeitando-as violentamente a estudos dos quais a criança não gosta; impondo simultaneamente e às vezes desde a mais tenra idade estudos aquém de suas capacidades. Estamos criando crianças que abominam os estudos e que veem sua rotina como uma fase a ser superada e da qual quererá fugir assim que possível.

Como pais, devemos criar uma ‘Cultura do gosto’, devemos despertar em nossas crianças o desejo pelo conhecimento. O gosto é a faculdade de compreender e apreciar  o belo na natureza e na arte. Querer encontrar o conhecimento e se refestelar com ele. Chamá-lo para um dança e valsar pelos salões da vida sendo seu par.

Que estas palavras do Abade René Bethléem lhe façam refletir e redirecionar seus dias de educadora, como fizeram comigo, mesmo que a sua escolha não seja a educação domiciliar.

Abraço fraterno,

Maya